sexta-feira, 23 de outubro de 2009

A MÁGICA COTIDIANA:

Uma Reflexão sobre a Prática Docente

Rodrigo Neres


Aprendi que trabalhar com a educação é tratar de um dos ofícios mais perenes da formação da espécie humana. Nossas práticas se orientam por saberes e artes aprendidas desde o berço da história cultural e social. Ingenuidade minha se acreditasse e fizesse acreditar que a Escola Plural e outras propostas estão inventando modas. Prefiro pensar que estão apenas, e é muito, tirando do baú dos esquecidos da história do magistério artes que não deveriam ter sido esquecidas. Artes de um ofício. Saberes e sensibilidades aprendidas e cultivadas. Guardadas no cotidiano, nas gavetas das salas de aula de tantos mestres de agora e de outrora. (ARROYO, 2000, p.09)


Uma platéia de olhos atentos, sedentos, criativos, curiosos, iluminados, cheios de vida a espera de um movimento, de uma palavra, de uma novidade. A arte capaz de transformar, emergir e revelar sentimentos, conhecimentos, realidades e mundos. O fazer mágico que tem o poder de tocar e atrair até as mais inalcançáveis plateias e transformá-las, multiplicá-las, torná-las detentoras de novas e surpreendentes capacidades e habilidades, que são mágicas também.

Assim é o ensinar. Um ato de pura magia, repleto de significações que fazem com que os seus realizadores tornem-se mestres de artes e ofícios os quais, na contemporaneidade, carregam um duro fardo: o de salvar a humanidade ou pelos menos, resolver alguns dos principais problemas sociais e construir possibilidades de um mundo melhor. Mas para isso, faz-se necessário a união de muitos atos mágicos. Mágicos não do tipo “super-poderes”, mas com ações possíveis e inovadoras que façam a diferença, transformando realidades existentes e apontando novos e iluminados caminhos.

É necessário que os seres mágicos que habitam os corações de nossos educadores, cresçam e mostrem-se dispostos e engajados ao trabalho de revolucionar a espécie humana, desde a formação na academia até seus últimos dias de compromisso, para que tenham a certeza e o prazer do dever cumprido. Que no voltar-se o olhar para a tela elaborada por Clio, veja-se saborosos e resplandecentes frutos, sustentados por longos galhos possibilitando, cada vez mais, que outros seres consigam se saciar e tirar, desses frutos, novas sementes para plantarem suas esperanças.

O trabalho de um educador é mágico. Pois consegue fazer de sua aula uma grande mágica, na medida em que, proporciona aos seus alunos a prática de olhar o mundo de diferentes formas e com outros olhos, a partir das construções e das descobertas que realizam através dos conhecimentos que lhes são mediados.

Podemos muito bem estabelecer uma relação entre o fazer mágico e a prática docente, sendo que esta, vista como dinâmica, flexível, lúdica e revista com criticidade constantemente. As práticas docentes centradas na idéia de uma educação voltada para a vida dos educandos, para a propagação de uma cultura inclusiva e de princípios e valores de vida, é que vão transformar-se verdadeiramente em atos mágicos para a construção de um mundo melhor.

Há muito do trabalho de um mágico na prática docente cotidiana, pois da mesma forma que o mágico, o educador necessita ter habilidades que façam com que seus alunos sintam-se atraídos e motivados pelas suas aulas, utilizando-se de inúmeros recursos lúdicos e criativos para que a verdadeira mágica aconteça nos corações de seus educandos. Dessa forma,
TE>O mágico precisa, acima de tudo, acreditar em sua mágica, colocar em sua apresentação um pouco de todas as outras artes para ser considerado um grande artista. Assim, também o educador precisa agregar a sua prática pedagógica outros instrumentos para enriquecer o seu potencial e oferecer amplos desafios a seus educandos (DORNELES, 2005, p.45).

Cada vez mais, a interdisciplinaridade bate a porta das práticas pedagógicas dos educadores. Cabendo a eles ter e manter o preparo frente as constantes mudanças e avanços sociais. Espera-se um educador capaz de realizar e oportunizar que seus educandos façam constantes diálogos entre si e seus pares, entre os seres humanos e a terra. (WERNECK, 2008, p.20). Almejamos pequenas mágicas no cotidiano escolar, para que contribuam na formação de uma cadeia de boas e conscientes ações, voltadas à melhoria dos processos educativos, da qualidade de vida e das perspectivas de um futuro mais humano.

Sim! Podemos crer que cada educador é como o pequeno beija-flor da fábula do incêndio, onde ao se defrontar com as vastas e mortais chamas na floresta, procura não fugir, mas enfrentá-las com pequenas gotas de água. Ao ser questionado pelo leão, que seria impossível vencer as chamas com tão pequenas ações o beija-flor simplesmente responde que está fazendo a sua parte.

Por essa razão que as práticas docentes necessitam estar casadas com a responsabilidade social e vislumbrar uma ética planetária. Para que os educadores e suas mágicas possam estar engajados na construção de uma sociedade mais fraterna, solidária e justa. E para isso os educadores devem:

(...) estar conectados às pessoas e, sobretudo, aos educandos, para senti-los mais de perto e, pelo desenvolver de uma linguagem neomatricista, prepará-los para a vida, com os olhos no presente, onde as relações se fazem no dia-a-dia do educar (WERNECK, 2008, p.20)


E é justamente nesse educar do dia a dia, que devem ser apostadas as esperanças e os sonhos, mas as mágicas devem acontecer para que isso torne-se realidade. Além de que, os educadores devem apresentar um comprometimento pela causa, já que de nada valerá os espetáculos sem propósitos e objetivos que contemplem as tão desejadas mudanças.

Nesse contexto, entra em cena, a importância da formação continuada vista a figura do educador como elemento fundamental do espaço educacional, “já que ele é o agente de um processo de transformação da realidade social.” (LIMA In: GRANVILLE, 2007, p.166).

Quando se fala em formação devemos lembrar sempre, que as práticas pedagógicas são produtos das concepções de mundo, educação e humanidade que cada educador possui e faz transparecer em seus atos e em suas mágicas. Podemos refletir sobre isso, na medida em que:


A formação não se constrói por acumulação de cursos, de conhecimentos ou técnicas, mas sim, através de um trabalho de reflexibilidade crítica sobre as práticas e de re(construção) permanente de uma identidade pessoal. Por isso é tão, importante investir na pessoa e dar um estatuto ao saber da experiência (NOVOA, 1995, p. 25).


Para a realização das mágicas nas práticas pedagógicas, os educadores na maioria das vezes, ou quase sempre, contarão mais com a ajuda das experiências acumuladas, dos saberes e dos fazeres já constituídos em seus interiores, do que simplesmente com a formação teórica e acadêmica.

Devemos sempre integrar a teoria com a prática, confrontando-as e refletindo sobre ambas e os produtos que geram. Porque precisamos que nossos atos mágicos estejam fixados em fortes bases teóricas que darão todo o suporte necessário para as práticas e suas dialéticas reflexões.

Assim, uma prática docente mágica é a que oportuniza descobertas e prazeres que contribuam para a vida em sociedade. Que faz com que os educandos e toda comunidade envolvida nos processos de ensino e aprendizagem, sejam integrantes da trama tecida por Clio, de maneira construtiva e participativa. Sendo enfocado o trabalho integrado dos conteúdos de aprendizagem com atitudes, valores de vida, experiências vividas e diversidades culturais, levando a transformação das realidades sociais e ao aceno para as possibilidades de um mundo melhor.


Este é um dos desafios da educação escolar: reforçar a lucidez, proporcionar hábitos e ferramentas intelectuais que ajudem a compreender as implicações de nossa ação e seu significado no que se refere a grandes princípios, como solidariedade, justiça, democracia, respeito às diferenças ou ao meio ambiente, por exemplo. (PERRENOUD In: Pátio, 2003, nº. 25, p.19).


Desejamos profundamente, que nossos educadores coloquem seus seres mágicos a trabalhar com força e disposição total para darmos início a uma grande e coletiva construção de mágicas. Que suas varinhas sejam usadas como nunca, com criatividade, responsabilidade e comprometimento em todos os confins da Terra.

Que a cada dia, possamos tomar conhecimento de novas mágicas, divulgá-las, ensiná-las e aglutiná-las as nossas. Somarmos conhecimentos e experiências, tornarmos orgulhosos mestre de artes e ofícios capazes de revolucionar a espécie humana e construir com certeza um mundo melhor. Pois é possível!

Com carinho de um pequeno, mas sonhador colega mágico.
Dedicado à Doralice Peres Fank (Gica), por suas inúmeras mágicas.


REFERÊNCIAS:

ARROYO, Miguel G. Ofício de Mestre : imagens e auto-imagens. Petrópolis, RJ : Vozes, 2000.

DORNELES, Valdeci A. Pahins. Recreação, Arte Mágica e a Música, como Instrumento Pedagógico. São leopoldo, RS : Oikos, 2003.

LIMA, Claudia M. de. Formação Contínua do Professor de Ensino Fundamental e Educação a Distância: reflexões sobre o potencial de aprendizagem. In: GRANVILLE, Maria Antonia. Teorias e Práticas na Formação de Professores. São Paulo : Papirus, 2007.

NOVOA, Antonio. Profissão Professor. Portugal : Editora do Porto, 1995.

PERRENOUD, Philippe. Construir as competências desde a escola. Porto Alegre, RS : Artmed, 1999.

_________________; As competências a serviço da solidariedade. In: Pátio, 2003, nº. 25, p.19.

WERNECK, Hamilton. Professor: agente da transformação. Rio de Janeiro : Wak Ed., 2008.

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